: Gonçalo M. Tavares
: Nicolas Ehler
: Hausbesuch. Quatro banquetes (Europa) Vier Festmahle / Cuatro banquetes / Quatre banquets / Quattro Banchetti / Vier banketten
: Frohmann Verlag
: 9783947047048
: 1
: CHF 2.70
:
: Europa
: Dutch
: 166
: kein Kopierschutz
: PC/MAC/eReader/Tablet
: ePUB
Durante sete meses, o projecto da iniciativa do Goethe-Institut levou dez autoras e autores conhecidos, vindos de Portugal, Espanha, França, Luxemburgo, Bélgica, Itália e Alemanha, para encontros com pessoas comuns. Surgiram assim dez miniaturas literárias: Gonçalo M. Tavares compreende o significado de línguas minoritárias e migração através da sua anfitriã luxemburguesa. Em Frankfurt, anda às voltas com a questão de saber o que ambicionam ao certo os habitantes locais. Über sieben Monate hinweg brachte das vom Goethe-Institut initiierte Projekt zehn bekannte Autorinnen und Autoren aus den Ländern Portugal, Spanien, Frankreich, Luxemburg, Belgien, Italien und Deutschland mit Privatleuten ins Gespräch. So sind zehn literarische Miniaturen entstanden: Gonçalo M. Tavares versteht bei seiner luxemburgischen Gastgeberin die Bedeutung von Minderheitensprachen und Migration. In Frankfurt treibt ihn die Frage um, wonach die dortigen Einwohner eigentlich genau streben. A lo largo de siete meses, el proyecto impulsado por el Goethe-Institut ha invitado a diez escritores reconocidos de Portugal, España, Francia, Luxemburgo, Bélgica, Italia y Alemania a encontrarse con ciudadanos de estos países. El resultado fueron diez miniaturas literarias: Gonçalo M. Tavares entendió, en casa de su anfitriona luxemburguesa, el significado de lengua minoritaria y migración. En Frankfurt, se obsesionó con la pregunta sobre cuál es exactamente la ambición de los habitantes locales. Pendant plus de sept mois, ce projet du Goethe-Institut a mis en contact dix écrivains connus, de sept pays différents (Allemagne, Belgique, Espagne, France, Italie, Luxembourg, Portugal) avec des personnes, dans l'intimité de leur foyer. Il revenait ensuite aux écrivains de raconter par l'écriture les expériences qu'ils avaient vécues. C'est ainsi que dix miniatures littéraires ont vu le jour : Gonçalo M. Tavares découvre chez son hôte luxembourgeoise l'importance de la migration et des langues des minorités. A Francfort, il est préoccupé par la question des savoir à quoi aspirent les habitants de la ville. Per sette mesi, il progetto avviato dal Goethe-Institut ha permesso a dieci autrici e autori noti - provenienti dal Portogallo, dalla Spagna, dalla Francia, dal Lussemburgo, dal Belgio, dall'Italia e dalla Germania - di incontrare e parlare con molti privati cittadini. Così si sono delineate dieci miniature letterarie: Gonçalo M. Tavares ha compreso il significato delle lingue delle minoranze e della migrazione in occasione della sua visita ai padroni di casa lussemburghesi. A Francoforte non vuole darsi pace prima di aver compreso quali siano i veri obiettivi degli abitanti di questa città. Dit project, een initiatief van het Goethe-Institut, bracht over een periode van zeven maanden tien bekende schrijfsters en schrijvers uit Portugal, Spanje, Frankrijk, Luxemburg, België, Italië en Duitsland met mensen in gesprek. Op die manier ontstonden tien literaire miniaturen: Gonçalo M. Tavares krijgt bij zijn Luxemburgse gastvrouw meer inzicht in de betekenis van minderheidstalen en migratie. In Frankfurt vraagt hij zich af waar de plaatselijke inwoners precies naar streven.

Gonçalo M. Tavares
Quatro banquetes
(Europa)


Banquete nº 1


Sento-me; ao meu lado, o hospitaleiro europeu. Como animal doméstico, mesmo com a sua expiração encostada ao meu braço desprotegidíssimo e civilizado, um tigre; não dos maiores, mas tigre, tigre das patas ao focinho; elemento que sempre conhecera como muito selvagem nos filmes, mas que, ali, garante-me de forma neutra o dono da casa, aquele, em particular, é mamífero individualmente pacifista.

 

– Só em grupo são perigosos – diz-me o dono da casa … – um pouco como os humanos – acrescenta, e ri-se, depois, às gargalhadas.

 

Pois sim, trata-se, a partir dali, de tentar descontrair, ou seja: o peso do rabo mais cabeça mais pernas e tronco deve pousar sobre a cadeira como se fruto de uma aterragem tranquilíssima de um elemento aéreo suportado por um balão larguíssimo e pachorrento, ou seja, descontrair, a nível muscular, é isso mesmo: deixar que todo o peso, cada um dos gramas, se entregue totalmente ao solo, mesmo que este seja um solo temporário e um pouco mais alto do que o nível do mar – uma cadeira. E ter medo, por outro lado, embora não suspenda a sempre companheira lei da gravidade, internamente, a nível bem íntimo e orgânico, pelo menos não deixa o corpo inteiro em repouso abandonado; ter medo é resistir, subir o que na queda ainda se permite, se bem que apenas de forma interna – manter erectos e atentos mais músculos do que os que se deixam cair no adormecimento. E, portanto, entre descontrair e controlar o pânico havia, naqueles instantes iniciais, ainda uma distância de maratona sensorial; sendo certo que o dono da casa fazia tudo para diminuir esse espaço, essa diferença. Em suma, eu estava tenso e com medo.

 

– Se não se sente à vontade com tigres, posso fechá-lo no quarto – disse-me ele, de forma atenciosa. E acrescentou –… no quarto das crianças.

 

E no momento em que o meu hospedeiro diz

No quarto das crianças

julgo adivinhar-lhe ali, no cantinho de uns lábios bem sóbrios e frankfurtianos, um músculo, um único, sarcástico ou talvez sádico, quem sabe? Como ler, interpretar, fazer uma exegese profunda de um músculo mínimo na ampla e bem agitada cidade de Frankfurt? O que pode um músculo? – poder-se-ia perguntar. O que diz um músculo?

 

Bem, mas sim: o dono da casa parecia basicamente colocar-me diante de uma decisão de imperador romano: quem ficará em perigo de vida? Quem salvo?

 

Porque era quase como se ele tivesse dito: se não se sente tranquilo com o meu dócil e quase agrícola tigre, senhor animal pacato e da terra, se não se sente descontraído fecho-o no quarto onde as crianças brincam; com o risco, que existe, já se sabe, sempre que juntamos tigres e crianças, de surgir uma incompreensível e injustificada discussão que termine mal para a infância e para a harmonia do mundo.

 

Sou ou não suficientemente distante da compaixão em relação a quem não conheço para colocar em risco as brincadeiras do dia de amanhã de belas crianças de Frankfurt? A minha resposta éyes, sí.

 

Agradeço, pois, e respondo simplesmente

Sim, pode ser

palavras cobertas por um véu, que basicamente parecem substituir um grito sincero que evito despejar em sala tão simpática de Frankfurt; o verdadeiro grito que, claro, dada a minha sobriedade não desvelo.

 

– Sim, quero comer sossegado e não quero ser comido!!! Por favor, ponha o tigre no quarto das crianças!! No meio da brincadeira das crianças! Quero relaxar!!

 

É evidente que em Frankfurt os tigres não são muito bem vistos; há um certo preconceito, digamos. No entanto, precisamente em Frankfurt como em grande parte das cidades europeias, o fato e a gravata, as boas maneiras, a detalhada educação, a tolerância, o modo como a frasesomos todos iguais passou já há muito de ser aplicada aos homens para passar aos animais e às plantas

(os minerais ainda aguardam que o olhar civilizado os alcance)

os animais são todos iguais, temos de compreendê-los, as plantas –todas merecem água e sol, não sejamos injustos; enfim, a cidade estava debaixo desse novo oxigénio que em tempos mais lá para a frente se classificará certamente como

o oxigénio da segunda década do século XXI,

aquilo, então, a que atabalhoadamente, em cafés populares, se dá o nome de

politicamente correcto.

– No fundo, um tigre é um animal como os outros. Qual a diferença entre um tigre e o cão?

Sim, concorda